domingo, 24 de julho de 2011

Salvo el Crepúsculo

Estojo de Obras Completas, volume IV: Poesía y poética



                Dentre todos livros de poemas do Cortázar, “Salvo el crepúsculo” me parece ser o mais Cortázar e o menos livro de poemas. Eu disse “menos livro de poemas”, não menos poético. Aliás, bem pelo contrário.
                Isso porque, não sendo composto só de poemas, é o livro de poemas que dá a melhor noção sobre o que Cortázar achava da poesia. Alternam-se verso e prosa, que se comentam e se complementam. E tudo começa com uma nota que é bem representativa:

                                “Discurso del no método, método del no discurso, y así vamos.
Lo mejor: no empezar, arrimarse por donde se pueda. Ninguna cronología, baraja tan meszclada que no vale la pena. Cuando haya fechas al pie, las pondré. O no. Lugares, nombres. O no. De todas maneras vos también decidirás lo que te dé la gana. La vida: hacer dedo, auto-stop, hitchhiking: se da o no se da, igual los libros que las carreteras.
Ahí viene uno. ¿Nos lleva, nos deja plantados?”

Desde aí já se vê que a poesia é, para Cortázar, liberdade e aventura (como é ser caroneiro) e que o importante é começar por onde se conseguir, e depois vemos aonde vamos (o que é um consolo para quem, como eu, muitas vezes não sabe como começar).
Bem, depois que começa, “Salvo el crepúsculo” nos apresenta várias epígrafes entre os poemas: Marguerite Yourcenar, Haroldo de Campos, Franz Schubert, Joni Mitchell, John Keats, Octavio Paz, Isak Dinesen, “e por aí vai... e por aí vem...”, como diria Oliveira enquanto a Maga faz uma lista dos homens que já teve).
Será impossível comentar as centenas de textos do livro (não sou muito bom de estimativas numéricas, mas deve ser em torno de centenas, mesmo...), então vou comentar alguns que acho de maior destaque.
Em “Background”, prosa, iniciado pela genial frase “tierra de atrás, literalmente”, referindo-se ao título, Cortázar nos conta como a noite é importante para a sua escrita; explicando porque, desde a insônia até os sonhos, ela influencia e, ao mesmo tempo, é a fonte de suas linhas.
Seguem-se alguns poemas e então aparece “Para escuchar con audífonos”, texto até bastante conhecido, em que Julio discorre sobre duas paixões, poesia e música e, depois de nos explicar que certos sons sofrem uma espécie de atraso ou adiantamento quando escutados com fones de ouvido, diz:

“Cómo no pensar, después, que de alguna manera la poesía es una palabra que se escucha con audífonos invisibles apenas el poema comienza a ejercer su encantamiento.”

                Outro tema recorrente,  o tempo e seus descompassos, aparece em “Policronías”. Eis um trecho:

                               “Es increíble pensar que hace doce años
cumplí cincuenta, nada menos.

¿Cómo podía ser tan viejo
hace doce años?
Ya pronto serán trece desde el día
en que cumplí cincuenta. No parece
posible.
El cielo es más y más azul,
Y  vos más y más linda.
¿No son acaso pruebas
de que algo anda estropeado en los relojes?”

Na seção “Con tangos” temos, pelo que entendi, alguns poemas cortazarianos que foram transformados em tangos (não sei se isso aconteceu com todos os poemas dessa parte do livro). E a seção que segue, “Ars amandi”, é sobre o amor e o prazer. O que me chama mais a atenção nesta parte do livro são quinze poemas feitos para uma Cris (divididos em “Cinco poemas para Cris”, “Otros cinco poemas para Cris” e “Cinco últimos poemas para Cris”). Não tenho notícia de nenhuma Cris na vida do Julio, por isso os poemas me surpreenderam, já que são tomados de carinho.
Em “In itálico modo”, há poemas que não são exatamente em italiano, mas em algo que se parece; diz Cortázar, no início da seção, que são poemas mais preocupados com a sonoridade e com o ritmo. E soam, mesmo, muito bem.
“Grèce, Grecia, Greece 59” impressiona pelo poliglotismo: um poema escrito em três línguas (espanhol, francês e inglês), tendo por cenário a Grécia.
“La noche de Lala” é um belo, lindo, na verdade, capítulo excluído de “O livro de Manuel”. Talvez devesse ser parte de “Diário de Andrés Fava”, porque Julio escreve que seu autor foi Andrés. Em todo caso, conclui JC, depois de ter relido o texto, se encaixa muito bem em “Salvo el crepúsculo”, por sua poesia.
“La noche de las amigas” é um longo e meio caótico poema manuscrito; fala das mulheres de sua vida (tanto as reais como as imaginárias), como se estivessem todas reunidas em um encontro, “todas ellas dándose al juego de la noche, midiéndose y hablándose y queriéndose y burlándose, todo tan lesbiano sin serlo y siéndolo, todo tan de ellas como las había conocido o querido o solamente imaginado por una foto”.
“Notre-Dame la nuit” e “Los vitrales de Bourges” são dois poemas muito bonitos, o primeiro sobre o magnetismo exercido pela igreja de Notre Dame, e o segundo, muito bem executado, sobre os vitrais e a luminosidade que os atravessa.
Termino (já com medo de que alguém em acuse de prolixo ou de leviano; aqueles porque escrevi de mais, estes porque não escrevi sobre todos os poemas...) com um trecho do iníco de “Inflación que mentira”, que, acho, serviria bem para epígrafe de um conto ou romance (agora me falta só a ideia para o conto ou romance, portanto): 

“Los espejos son grátis
pero qué caro mirarse de verdad”

terça-feira, 12 de julho de 2011

Rabbits for my closet II

Morellianas: Quantas e que pessoas participaram do projeto?
Alfredo: No total fomos cinco os envolvidos:
* Lionel, 31 anos. Foi quem teve a ideia original e contatou o resto da equipe. Seu trabalho ao longo do projeto poderia ser classificado como o de um produtor.
* Pablo, 24 anos. Desenhista gráfico, encarregado de toda a parte artística (conceitos, cenários, personagens, animações etc.).
* Ezequiel, 24 anos. Game designer, encarregado de ajustar a mecânica do jogo e o projeto dos níveis.
* Facundo, 24 anos (Estudio Ataxia). Compositor da música e encarregado dos efeitos sonoros.
* Alfredo, 26 anos. Programador do projeto. 
Dos cinco, Pablo, Ezequiel eu (Alfredo) formamos um estúdio em que desenvolvemos jogos eletrônicos e outras experiências interativas: Purple Tree Studio.

Morellianas: Como surgiu a ideia para o jogo?
Alfredo: Quem teve a ideia foi Lionel. Fazia tempo que ele tinha a ideia de fazer um jogo em homenagem a Cortázar, baseando-se na premissa de que o próprio autor é muito lúdico em sua obra. Um dia veio falar com a gente e disse "Quero fazer um jogo baseado em ‘Carta a uma senhorita em Paris’", e comentou com a gente sua ideia de empurrar coelhos para dentro um armário como mecânica de jogo.

Morellianas: Como foi o processo de criação? Foi complexo? Levou muito tempo?
Alfredo: A partir da proposta de Lionel, começamos a nos encontrar uma vez por semana, ou uma vez a cada duas semanas: em cada reunião surgiam ideias e mudanças no conteúdo do jogo, no significado, no que queríamos fazer, etc.
O processo foi relativamente lento, porque cada um de nós tinha um trabalho fixo à parte, e este projeto surgiu como algo extra, sem nenhuma intenção de lucro, em que podíamos trabalhar unicamente nos fins de semana (o nas noites de dias de trabalho). Por isso, mesmo sendo um projeto que poderia ter sido executado em uma ou duas semanas, nos tomou, desde a ideia inicial até lançá-lo, uns 5 meses. Contudo, me parece que teve seu lado positivo, já que nos momentos em que não estávamos trabalhando ativamente no projeto, as ideias iam se desnvolvendo e evoluindo em um segundo plano, e assim conseguimos ter coisas novas para cada reunião.

Morellianas: Como o público reagiu ao jogo? Vocês recebem muitos comentários?
Alfredo: A reação do público superou minhas expectativas. Talvez não tanto pelo lado dos conhecidos (parentes, amigos..), que dizem mais ou menos o que se espera (parabéns, que gostaram, que não entenderam tal o qual coisa, que lhes pareceu isso ou aquilo)... mas sim do lado dos desconhecidos. Recebia um e-mail de alguém na Espanha que me perguntava coisas sobre o jogo, ou de repente estavam nos convidando a exibi-lo em alguma exposição (em particular uma que aconteceu aqui [na Argentina], a: Game On!).
Também nos contataram para pequenas notas em algumas revistas e blogs; e, claro, você também, que entrou em contato aí do Brasil!

Morellianas: Por que os coelhos do jogo crescem?
Alfredo: Isso tem a ver com o que queríamos conseguir com o jogo, de maneira que, se não se importa, vou aproveitar esta pergunta para formular uma mais geral em que vai estar a resposta: Que objetivos tinham com o jogo? Por que ocorrem as coisas que ocorrem?
O que queríamos fazer com Rabbits for my Closet é levar o gênero literário de Cortázar ao mundo dos jogos eletrônicos. Mas não queríamos usar o conto como um roteiro, onde cada parágrafo te indica exatamente o que você vai ver no jogo. O que tentamos fazer foi não copiar a história tal qual, mas que o jogador de Rabbits for my closet sinta o mesmo que o leitor de “Carta a uma Senhorita em Paris”: o desespero, a sensação de que o tempo está acabando, essa noção do espaço que se fecha, o estar atado ao inevitável.

Há dois elementos próprios de um jogo eletrônico que não se encontra na literatura, e os aproveitamos para reforçar a ideia daquilo que queríamos conseguir. Por um lado, em um jogo eletrônico o jogador é o personagem. Não lê sobre um personagem, mas é ele, o maneja, o move, o controla. Isto facilita muito essa ideia de "sentir o que o personagem seente", que nem todos alcançam ao ler um conto ou romance. Por outro lado, em um jogo eletrônico costuma haver um objetivo. Neste caso o fizemos simples: você tem de botar os coelhos no armário, esse é seu objetivo. O que fizer, fará com isso em mente. Esta ideia de objetivo usamos mais adiante, para ajudar que o jogador sinta o que nós queremos que sinta.
Como nota aparte, fizemos a mecânica a mais simples possível (simplesmente se mover usando las teclas), para que uma maior quantidade de pessoas pudesse ter acesso ao jogo (na Expo Game On, um senhor de 65 anos jogou pela primeira vez um jogo eletrônico graças a isso).
Queríamos que o jogador sentisse desespero, e isso conseguimos com outro recurso dos jogo eletrônicos: um contador regressivo. O jogador se sente pressionado pelo tempo, sente que não chega a atingir seu objetivo (guardar os coelhos no armário), e se está muito perto do fim do tempo, alguém (a empregada) começa a bater na porta, e isso influi na sensação de desespero.
À medida que passam os níveis, há mais coelhos, o objetivo é mais difícil, e cada vez se chega a ele mais perto do limite de tempo. Por outro lado, a música (recurso extra que um jogo eletrônico tem, mas um conto não) gera um estado de tensão que reforça tudo mencionado anteriormente.

Com respeito ao que acontece depois de cada flash de luz branca, para isso nos baseamos em uma interpretação do conto (compartilhada por Lionel e eu) que afirma que os coelhos representam problemas, angústias do personagem. O personagem, em vez de resolvê-los,os esconde do resto das pessoa. À medida que passa o tempo, seus problemas e angústias são tantos y tão difíceis de suportar que acaba se suicidando.
Com isso em mente, usamos dosi recursos: por un lado, inverter a sala. Com isso queríamos que o jogador sinta que o contexto mudou: que pense "merda, o que eu vinha fazendo para atingir meu objetivo (empurrar os coelhos para a direita) agora me afasta, tenho de pensar um uma nova estratégia". Ainda que o jogador não formule exatamente esse pensamento, o importante é que sinta isso, que sinta algo similar ao que sente uma pessoa quando, na vida cotidiana, algo muda de contexto contexto para ela, o que faz com que tenha que pensar em um novo modo de agir para cumprir seu objetivo.
Por otro lado, o recurso dos tamanhos. Quando os coelhos crescem, queremos dar a impressão de que os problemas sobrepujam o indivíduo, que agora é preciso empurrar coisas enormes. Mas também queremos que o jogador sinta que ainda assim pode conseguir (os coelhos, ainda que sejam grandes, podem ser empurrados para o armário). Quando os coelhos ficam pequenos representamos os momentos em que o indivíduo se sente superior aos problemas, quando se dá conta de que estava se preocupando por coisas que não eram tão importantes na verdade. E relacionado a isso, está o momento em que o personagem principal cresce: representamos os momentos em que a pessoa se sente com o poder de superar qualquer problema que tenha, fazendo-os parecer insignificantes.

O último nível do jogo é o mais especial: o suicídio. No conto, o personagem se suicída, o leitor não pode evitar isso. Contudo, vive a situação como un leitor (do conto e da carta), não como o personagem. O leitor se informa de que o personaje se suicída. Queríamos que o jogador não se inteirasse de que o personagem se suicida, mas sim que seja ele quem se suicida. Para conseguir isso, no último nível mudamos alguns aspectos chave: Por um lado, no se consegue empurrar os coelhos; há onze, e estão ali, donos do apartamento, vitoriosos sobre o personagem. Por outro lado, o andar do personagem muda: a animacção é mais lenta e percebemos ele apático. E por último e mais importante: sem importar que tecla o jogador pressione, o personagem sempre vai se aproximar da janela. Desta manera, conseguimos que o jogador sinta o inevitável desse desenlace, assim como o sente ao ler a carta; impotência. A isso se soma um ingrediente interessante: se o jogador não pressiona nenhuma tecla, o personagem fica quieto, e se pressiona alguma tecla se aproxima da janela... portanto, em última análise, é o jogador quem ocasiona a morte de personagem, porque é ele quem lhe dá a instrução de caminhar. O jogador acaba se suicidando.

Morellianas: Há intenção de fazer mais algum jogo baseado nos textos de Cortázar?
Alfredo: Depois de lançar o jogo falamos sobre nosso próximo projeto não relacionado a trabalho. Nós cinco temos vontade de fazer algo interessante como Rabbits for my Closet, mas ainda não nos decidimos se vai ser do Cortázar, ou se sequer vai ser relacionado à literatura. Assim que tiver novidades de nossa próxima ideia, comento contigo!

Morellianas: Como conheceu a obra do Julio? Qual foi o primeiro livro dele que leu? Leu muitas de suas obras?
Alfredo: Meu primeiro contato com Cortázar foi enquanto cursava primário: me fizeram ler “Casa Tomada” e analizá-lo. Naquele momento, não passou daí o interesse. Mas por volta dos 18 anos voltei a lê-lo, e li outros contos, e não teve como voltar atrás.
De seus romances, li “O jogo da amarelinha”, o resto foram todos contos; na verdade faz apenas dois anos que terminei de comprar uma coleção de três volumes com seus contos completos. De todo modo, não li nem a metade dos contos... é uma dívida que tenho com Don Julio.

Morellianas: Qual seu libro favorito do JC? E seus três contos favoritos?
Alfredo: Não sei se há um livro favorito... não posso deixar de mencionar “Todos os fogos o fogo” e “Histórias de cronópios e de famas”.
E contos... uff... Podem ser quatro? Em último caso descartamos o último... Vamos ver: “A saúde dos doentes”, “Histórias de cronópios e de famas”, “Um tal Lucas” e “A auto-estrada do sul”.

Morellianas: Como Cortázar é visto hoje na Argentina, em sua opinião? É fácil encontrar suas obras nas livrarias y bibliotecas?
Alfredo: Cortázar é, na Argentina, reconhecido em todos lados. Tem uma particularidade, no meu entender, e é que qualquer um pode ler e apreciar Cortázar, mesmo que não chegue a entendê-lo totalmente (é o que me aconteceu ao ler “O jogo da amarelinha”).
É por isso que, me parece, é um dos autores com leitores de idades mais variadas. Na exposição Game On se aproximavam de nosso estande tanto jovens de menos de 20 anos como avós de mais de 60.
Nas livrarias há edições com os contos e romances de Cortázar, felizmente não é difícil de conseguir sua obra.
Gostaria que incentivassem mais sua leitura nos colégios. Não só analisando “Casa Tomada” como aconteceu comigo, mas também fazendo com que meninos de 16 anos leiam contos como “Histórias de cronópios e de famas”, ou “Um tal Lucas”, e que não o analisem, que o desfrutem. Cultivar essa curiosidade de "Que curioso como ele escreve... que outras coisas terá publicado este senhor?".

Morellianas: Por último, por que ler Cortázar?
Alfredo: Creio que, complementando algo do que foi dito anteriormente: Por que Cortázar? Porque Cortázar é universal. Em tempo, em espaço, em idade. Cortázar te convida a brincar, e não te castiga (como, digamos, Borges) se você não está 100% preparado antes de começar a lê-lo. Jovens, adultos, todos podem ler Cortázar, e todos o desfrutam, ainda que seja em níveis diferentes.
Para mim, Cortázar é uma guloseima em forma de livro. E todo mundo desfruta uma guloseima.

Espero que as respostas sirvam. Te mando também o link ao site oficial do jogo, onde há um pouco mais de informação, um trailer e imagens, se quiser por algo no blog.

sábado, 9 de julho de 2011

Rabbits for my Closet I


Amigo cronópio, amigo piantado: que ideias vêm à sua cabeça quando se fala em Julio Cortázar? Proponho deixar os mapas conceituais e o gerador de lista de frequência de palavras para os famas; façamos nós uma investigação na nossa memória sentimental ligada aos textos cortazarianos.

Fizeram as suas aí? Bem, eu fiz a minha aqui e provavelmente vamos ter encontrado coisas semelhantes: América Latina, liberdade, compromisso, cronópios... Mas uma das primeiras foi jogo. Geralmente, quando alguém se refere ao conceito de jogo em Cortázar tem a ver com uma filosofia, uma poética de Julio. Mas, convenhamos, não é de se admirar que alguém tenha levado "jogo" num sentido mais específico (é de se admirar, isso sim, que alguém não tenha pensado nisso antes!).

Reproduzo um post que encontrei há algum tempo. (Agradeço a Gaby Larralde a permissão de reproduzir aqui o texto, traduzido por mim - ou seja, não esperem uma tradução perfeita -; aliás, o Morellianas procura tradutores voluntários. Se alguém tiver interesse, mande e-mail!):

Alfredo Hodes, um estudante de 26 anos de Engenharia em Informática da UBA [nota: Universidade de Buenos Aires, instituição pública] inventou um videogame baseado em um de meus contos preferidos de Julio Cortázar, “Cartas a uma senhorita em Paris” (Bestiário, 1951).
O videogame se chama “Rabbits for my closet” e, como no conto, o protagonista vomita pequenos coelhos que começam a destroçar a casa. Desesperado, ele tenta ocultá-los no armário. A tarefa do joguinho consiste em ajudar o personagem a conseguir isso, bloqueando o caminho dos coelhos com os móveis do aposento, antes que o tempo acabe. O jogo – além disso - inclui citações textuais.
Jogueeeeee AQUI.

Imagem do jogo, como publicada no site da Gaby.
Genial, não é?
O jogo é muito divertido e não é moleza, não. Além disso, é muito bem feito e oferece mais do que apenas diversão - uma interpretação do conto cortazariano.

O que está esperando? Jogue lá e depois venha aqui contar o que achou!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Cortázar de bolso II

Pessoal, essa dica é do Rafael, que comentou no post sobre a edição de bolso de Octaedro. Eu não tinha visto, mas o Rafael deu a dica: além de "Octaedro", saiu pela BestBolso, "Todos os fogos o fogo" (de novo, clique no link para ler a resenha do livro aqui no Morellianas)


Assim como a edição de "Octaedro", esta tem preço sugerido de R$ 12,90 e também já segue as modificações do acordo ortográfico. Estranhei um pouco a diminuição substancial no número de páginas: de 208 para 160 - quase 25% a menos. A redução na edição de bolso de "Octaedro" é de 12,5% - ou seja, o percentual de redução em "Todos os fogos o fogo" é quase o dobro! Estranho, não acham? (O lado bom é que o preço foi bem reduzido também - mais de 50%, já que a edição "normal tem preço sugerido de R$ 28,00) Se alguém tiver essas edições em mão, por favor mande um comentário aqui, dizendo se o tamanho da letra é razoável.

Clique na imagem da capa para ir ao site da editora e ver mais informações.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Cortázar de bolso

Antes de todo mundo começar a falar de e-books, muito se falava do que os pocket books (livros de bolso) fizeram pelo marcado editorial. Já ouvi falar de uma editora que teria sido salva de fechar as portas só por causa do sucesso dos "livrinhos".

Cortázar nunca teve uma edição de bolso no Brasil. Em formato de bolso até talvez vá lá... Mas não com preço de pocket book - falo dos tomos de "A Volta ao Dia em 80 Mundos" e "Último Round". Agora o grupo editorial que detém alguns dos direitos dos livros do Cortázar no Brasil muda isso.

Saiu pelo selo BestBolso uma simpática edição de "Octaedro" (clique no link para ler a resenha do livro aqui no Morellianas). A tradução é a mesma, feita por Gloria Rodríguez, e o número de páginas é quase o mesmo - o que provavelmente significa um tamanho de letra decente.



Uma iniciativa bem bacana. "Octaedro" tem contos marcantes e muito profundos, inclusive um dos meus favoritos. Além disso, Cortázar (ele disse algo parecido sobre John Keats) é um daqueles autores para se ter no bolso, para andar sempre com a gente, dividir os momentos num parque, num metrô, na rua.

O livro tem preço sugerido de R$ 12,90 (excelente para a média dos preços de livros nacionais) e já segue as modificações do acordo ortográfico. Clique na imagem da capa para ir ao site da editora e ver mais informações.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Nicarágua tao estranhamente inédita

Capa da segunda edição - a primeira pela Muchnik Editores

Já fiz aqui meu comentário sobre “Nicaragua, tan violentamente dulce”, mas volto ao assunto porque descobri que, de certa forma, meu texto está incompleto. Para começar, a edição nacional (na qual baseei meu primeiro texto) traz, no lugar do poema “Notícia para viajantes” (“Noticia para viajeros”, em espanhol), apenas o título do poema e uma foto de Cortázar.
 E mais: acontece que a primeira edição do livro é de 1983, quando a Ediciones Monimbo publicou-o em Manágua. No ano seguinte, porém, a Muchnik Editores (de Mario Muchnik, amigo e por vezes fotógrafo de Julio Cortázar – inclusive no último verão da vida de JC, que passaram juntos) publicou, em Buenos Aires, uma edição aumentada (dados da bibliografia estabelecida por Gladis Anchieri para a edição crítica de “Rayuela” na Colección Archivos). Essa edição continha cinco textos a mais e, como só soube disso há pouco tempo, escrevo este texto para complementar o anterior.
                Não sei por que a editora que publicou “Nicarágua tão violentamente doce” (aliás, não sei se leva vírgula, dois pontos ou nada... em cada lugar está escrito de um jeito diferente...) no Brasil usou a versão da Monimbo e não da Muchnik. Talvez questões contratuais, royalties, ou algum outro problema pouco compreensível para quem não é do ramo, como eu. Mas o problema da omissão de “Notícia para viajantes” no livro me parece que foi descuido. Nunca fez nenhum sentido para mim que uma foto de Cortázar aparecesse na primeira página do livro e com um título – ainda mais com um título que não parecia ter nada a ver com a foto. (Já se viu alguma foto que fosse a notícia, e não apenas ilustrasse a notícia?)
                Enfim, o que está feito, feito está; mas é uma pena que o poema não tenha aparecido na versão nacional, porque, para mim, é o texto mais bonito do livro, pelo menos entre esses que estavam inéditos para mim até pouco tempo. Em seis quadras, Cortázar descreve um lugar onde “todo es corazón y rienda suelta/ y en las caras hay luz de mediodía,/”; um lugar que não é nenhuma das metrópoles da América Latina e a que se chega guiado pelo vento da liberdade; Manágua, “de pie entre ruinas", mais que uma terra, tem “su puerta abierta,/ todo el país es una inmensa casa”. Acredito que esta é a melhor expressão do que sentia Cortázar por aquela época; a Nicarágua era o lugar onde se sentia em casa, porque, apesar de sua ligação com a França e com a Argentina, não havia, nesses dois outros lugares, como conciliar, liberdade e latinidade.
                Os outros textos não são tão poéticos, mas são intelectualmente muito aguçados. O primeiro deles, talvez o mais completo, é “Apuntes al margen de una relectura de «1984»”, em que Julio compara a realidade de então com aquela imaginada por George Orwell no livro “1984”. Misto de crítica literária com tese sociopolítica, nele a obra de Orwell e a condição do povo nicaraguense se complementam e se explicam.
                Seguem-se, então, os textos que estão também na outra edição. Os textos que só aparecem nesta continuam após o último texto da outra edição, ou seja, “Discurso de recepción de la Orden Rubén Dario”. “Las batallas desiguales” é o primeiro deles. Nele, Cortázar analisa como os artigos de jornais (principalmente dos Estados Unidos e da Europa) podem distorcer a informação, negando ao seu público a realidade do que ocorria, então, na Nicarágua.
                “Um sueño realizado: El arte de las Américas llega a Nicaragua” tem uma temática mais animadora: a criação e gerência de um grande museu de artes no país centro-americano. Transcrevendo trechos de uma conversa com Carmen Waugh, Julio conta como se conseguiu obter doações de obras de arte e encontrar um espaço para exibi-las, partindo de uma ideia que não centralizasse o museu em Manágua, mas que espalhasse a arte por todo o país, à medida do possível.
                Em seguida, “Nicaragua: El «fast food» de las noticias” volta a comentar sobre as notícias, mas desta vez focando na inação dos leitores, daqueles que as liam mas não faziam nada, acreditando confortavelmente que apenas a adesão ideológica era suficiente. ”¿Nos vamos a quedar así, comiendo el fast food de las noticias diarias como si vinieran de Marte?”, pergunta Cortázar a certa altura do texto. E, mais adiante: “Hay momentos en que envidio al primer bonzo que se inmoló por el fuego como gesto supremo de repugnancia ante lo que lo rodeaba. Pero a la vez sé que ese no es el camino. Un pueblo se bate allá lejos por su dignidad y su felicidad: en su ejemplo está el camino. ¿De qué sirve escribir estas líneas que tanta gente tirará junto con el diario? De nada, piensa el bonzo y se pega fuego. Pero la verdadera nada, el triunfo de la entropía definitiva, estaría en no escribirlas.” O que é uma crítica que será sempre atual, seja na Nicarágua da década de 1980 ou no Brasil da década de 2010 ou em qualquer lugar e tempo.
                Por fim, “De diferentes maneras de matar”, em que Cortázar fala da vontade do governo nicaraguense em negociar (os EUA cessariam de ajudar grupos antirrevolucionários nos países vizinhos enquanto a Nicarágua cessaria de ajudar forças rebeldes em El Salvador, por exemplo), vontade que não encontra recíproca nos americanos, segundo JC. É um texto longo, complexo e, creio, mais datado que os outros – mas o principal é bastante compreensível . Cortázar ajuda a entender o que quer dizer com suas comparações (como Maquiavel falando de César Borgia, por exemplo) e com conclamações (“¿Dejaremos que le claven las manos y los pies para que un insolente procónsul siga jugando con el resto del mundo en nombre de una pax... norteamericana?”).
                Algumas edições ainda trazem “«Buenas noches»”, uma entrevista com Julio.